Nesta quinta-feira (16), a Secretaria Municipal de Saúde (SMS) de São Cristóvão recebeu representantes da ASTRA, instituição não-governamental que atua na busca da cidadania e garantia de Direitos Humanos, para a realização de uma oficina sobre atendimento sensível às necessidades da população LGBTQIAPN+ na saúde. A discussão, feita para duas turmas divididas nos períodos da manhã e da tarde no auditório do Museu de Arte Sacra, inaugura o projeto “Quem Somos Nós?”, visando entender as diversas características identitárias e valorizar o potencial humano dos profissionais da saúde.
Segundo Ewertton Nunes, membro da Coordenação de Educação em Saúde da SMS, a proposta da formação partiu da ASTRA, sendo prontamente abraçada pela SMS por estar em comunhão com as diretrizes de equidade trabalhadas na Cidade Mãe e na secretaria, que defende a equidade de gênero, sexualidade, raça, idade, para pessoas com deficiência e outras temáticas sociais.
“Buscamos realmente conseguir minimizar as iniquidades no SUS, porque partimos da premissa de que os trabalhadores e trabalhadoras são parte da sociedade e, dessa forma, carregam muitas vezes equívocos, preconceitos e conhecimentos antecipados que vêm da cultura e do senso comum. Precisamos qualificar cada vez mais o serviço. Por isso, estamos trazendo essa temática hoje”, afirma.
Ewertton Nunes, membro da Coordenação de Educação em Saúde da SMS
O evento foi pensado para servidores da saúde e contou com a presença de gerentes das unidades básicas, que se responsabilizaram em repassar o conhecimento e cobrar atendimento adequado e sensível para todos os pacientes, respeitando as particularidades de cada um. Isso inclui a necessidade do uso de nome social em cadastros e atendimentos, o respeito à identidade de gênero, a proteção e o cuidado com pacientes transgêneros na realização de todos os exames e consultas, a compreensão da diferença entre gênero e sexualidade, entre outras questões.
Jonathan Santos, diretor da ASTRA e coordenador do Centro de Referência LGBTQIAPN+ de São Cristóvão, destaca a parceria contínua estabelecida também com a Secretaria de Assistência Social, que inclui em seu plano de trabalho a proposta de humanizar e sensibilizar os profissionais da gestão pública do município.
“A saúde, a assistência social e a educação são três dos nossos focos principais, porque são os espaços que entendemos como muito necessários para nossa existência e que é onde existe sempre muita rejeição. Então, esse processo de sensibilização é para que a minha população frequente esses espaços é que tenha um atendimento qualificado, ao qual possam retornar”, destaca o diretor.
Jonathan Santos, diretor da ASTRA e coordenador do Centro de Referência LGBTQIAPN+ de São Cristóvão
A oficina contou com Adriana Lohanna, voluntária da ASTRA e mestre em Educação, como ministrante. Ela evidencia que, a partir do Centro de Referência LGBTQIAPN+ do município, foi formado um núcleo de discussão e formação, que, em parceria com a SMS, tem construído atividades de formação para os servidores e profissionais da saúde. Na ocasião, a ministrante dividiu sua fala em dois momentos: No primeiro, apresentou o significado da sigla LGBTQIAPN+ e, logo após, discutiu sobre as principais potencialidades e dificuldades que a comunidade enfrenta em suas demandas de saúde.
“É importante trazer essa discussão para os profissionais de saúde, sobre os conceitos básicos da nossa população, para que eles se sintam preparados no atendimento e acolhimento humanizado a essa população. É para entender não somente quem somos, mas quais são as principais dificuldades no acesso à saúde para a população LGBTQIAPN+”, ressalta.
Adriana Lohanna, voluntária da ASTRA e mestre em Educação
Lohanna ainda pontua a necessidade de entender algumas especificidades do atendimento:
“É preciso entender, por exemplo, quando a mulher lésbica, no exame ginecológico, precisa de um bico de pato de tamanho diferente da mulher heterossexual, porque a atividade sexual não é a mesma. Ou entender que mulheres trans, além da questão do nome social, necessitam de todo um processo de organização, desde a ideia de que exame tem que ser atendido de forma diferente porque mulheres trans fazem PSA e estão sendo colocadas junto aos homens por causa da próstata. Ou que homens trans podem precisar do exame de gravidez e outros exames ginecológicos. Entender que existirão situações do cotidiano da saúde para nossa população em que os profissionais precisarão interceder pelos pacientes para oferecer um atendimento mais humanizado e igualitário”.
Séphora Juliana, assessora da Coordenação de Estratégia Saúde da Família, participou da formação e enfatizou que a Atenção Primária à Saúde é a porta de entrada de todos os usuários do Sistema Único de Saúde (SUS). Para ela, considerando a temática que foi dialogada, é necessário considerar que os profissionais de saúde estão na ponta para recepcionar os pacientes, mas nem sempre contam com o preparo para isso.
“Esses entendimentos são necessários para que o acolhimento seja realmente feito da melhor forma possível. As gerentes também foram convidadas para estar dentro desse espaço para que a sensibilização seja começada por meio delas e seja repassada para os profissionais na ponta. Assim, conseguimos garantir que a comunidade consiga acessar a saúde de todas as formas, independente de gênero, de orientação sexual e afins, e que possa ser realmente muito bem acolhida”, pontua Séphora.
Séphora Juliana, assessora da Coordenação de Estratégia Saúde da Família
Para além da sigla
A versão mais atual da sigla LGBTQIAPN+ é abrangente para abraçar diferentes tipos de identidades sexuais e de gênero e pode ser modificada ou acrescentada a qualquer momento, à medida que estudos de gênero e sexualidade se aprofundam e a luta da comunidade evidencia novas nuances e demandas.
As diferentes letras são usadas como importantes ferramentas para ajudar a incluir e compreender a pluralidade de identificações do ser humano, o que vai além de classificar pessoas e colocá-las em caixinhas.
Entenda o que as letras da sigla significam:
L: Lésbicas
Mulheres que sentem atração sexual e afetiva por outras mulheres.
G: Gays
Homens que sentem atração sexual e afetiva por outros homens.
B: Bissexuais
Pessoas que sentem atração sexual e afetiva por homens e mulheres.
T: Transexuais
Pessoas que se identificam com um gênero diferente daquele que foi designado para elas quando nasceram.
Q: Queer
Termo que foi apropriado do inglês como uma forma de designar pessoas que não se encaixam à heterocisnormatividade, que é a imposição compulsória da heterosexualidade e da cisgeneridade.
I: Intersexo
Pessoas que não se adequam à forma binária (feminino e masculino) de nascença. Ou seja, seus genitais, hormônios, etc. não se encaixam na forma típica de masculino e feminino.
A: Assexual
Pessoas que não possuem interesse sexual. Esse grupo pode ser também arromântico ou não, ou seja, ter relacionamentos românticos com outras pessoas.
P: Pansexual
Pessoas que desenvolvem atração física, amor e desejo sexual por outras pessoas independentemente de sua identidade de gênero.
N: Não-Binário
Pessoas que não se identificam com nenhum gênero ou se identificam com vários gêneros.
+
O ‘mais’ é usado para abranger as demais pessoas da bandeira e a pluralidade de orientações sexuais e variações de gênero. Segundo Adriana Lohanna, hoje são conhecidas outras 32 identidades para além das letras já usadas na sigla.
Fotos: Clara Dias